A baixa demanda e a desvalorização acelerada dos carros elétricos estão levando as locadoras de veículos a repensarem suas estratégias em relação a essa tecnologia. Mesmo sendo responsáveis por uma grande fatia das vendas das montadoras, as empresas do setor estão cautelosas quanto à expansão de suas frotas eletrificadas.
Desafios enfrentados pelas locadoras
As locadoras, que tradicionalmente representam cerca de metade das vendas totais de automóveis das montadoras, têm observado que os veículos elétricos não estão atendendo às expectativas iniciais. Atualmente, a frota eletrificada dessas empresas representa menos de 1% do total, evidenciando a relutância em ampliar investimentos nesse segmento.
Um dos principais obstáculos é a depreciação acentuada dos veículos elétricos usados. Modelos adquiridos há cerca de três anos estão sendo revendidos com uma desvalorização entre 40% e 45%. Essa queda no valor de revenda se deve, em parte, à entrada de marcas chinesas no mercado, oferecendo modelos mais avançados e com preços competitivos, o que forçou as montadoras tradicionais a reduzirem seus preços.
Casos que ilustram a situação
Empresas pioneiras na adoção de carros elétricos, como a Movida, adquiriram centenas de unidades de modelos como Nissan Leaf, Renault Zoe, Fiat 500e e BMW i3 a partir de 2021. Contudo, em menos de dois anos, grande parte desses veículos estava parada nos pátios devido à falta de interesse dos consumidores. Alguns modelos chegaram a ficar encalhados por até seis meses e foram vendidos com descontos significativos em relação à tabela Fipe.
A situação não é exclusiva do Brasil. Nos Estados Unidos, a Hertz, uma das maiores locadoras do país, desistiu da aquisição de 100 mil carros da Tesla após constatar a rápida desvalorização dos seminovos elétricos.
Impacto no mercado de seminovos
Segundo dados da Fenauto, associação que representa os revendedores de carros usados, as vendas de veículos eletrificados (elétricos e híbridos) cresceram 90% entre janeiro e julho, totalizando 33 mil unidades. Apesar do crescimento expressivo, esses números ainda representam um nicho de mercado, especialmente quando comparados aos 8,8 milhões de veículos a combustão vendidos no mesmo período.
A maior parte dos eletrificados vendidos tem até três anos de uso, indicando que a depreciação afeta diretamente os proprietários iniciais. O presidente da Fenauto, Enilson Sales, ressalta que é prematuro tirar conclusões definitivas sobre o segmento, mas reconhece os desafios atuais.
Experiência dos proprietários
Proprietários de carros elétricos também sentem os efeitos da desvalorização. O empresário Maurício de Barros, após rodar 54 mil km em dois anos e meio com um Peugeot e-208 adquirido por R$ 249 mil, tentou vendê-lo sem sucesso. Sem propostas após quatro meses de anúncios, acabou aceitando R$ 100 mil em uma concessionária como parte do pagamento por um novo elétrico. “Foi um impacto financeiro significativo”, admite Barros.
Apesar da perda, ele optou por investir em um novo modelo elétrico, um BYD Yuan Plus, que oferece mais tecnologia e maior autonomia. A decisão reflete a evolução rápida do mercado, onde modelos mais recentes superam os anteriores em desempenho e recursos, mas também evidenciam a volatilidade dos preços.
Estratégias das montadoras chinesas
As marcas chinesas, como BYD e GWM, têm agitado o mercado brasileiro com ofertas de carros elétricos e híbridos. Com planos de iniciar a produção local no próximo ano, as empresas pretendem trazer modelos mais acessíveis e adaptados às necessidades do consumidor brasileiro. Para combater a desvalorização e conquistar a confiança dos compradores, ambas estão implementando programas de recompra de seminovos a valores próximos aos da tabela Fipe.