A indústria brasileira de pneus automotivos vive um momento de retração silenciosa, mas persistente. Os números mais recentes indicam que, mesmo com algum respiro vindo das entregas diretas às montadoras, a engrenagem do setor segue travada pelo desempenho fraco no mercado de reposição.
Até setembro de 2025, as vendas totais somaram cerca de 29 milhões de unidades, um recuo de 2,7% em comparação ao mesmo período de 2024. A diferença, embora pareça discreta, aponta para uma tendência mais ampla de desaceleração estrutural, que exige revisão de estratégias e modelos produtivos.
Reposição em crise: o elo mais frágil da cadeia
O maior impacto da queda veio do segmento mais sensível: o mercado de reposição, que recuou 7% no acumulado do ano, totalizando cerca de 18,8 milhões de pneus. Este é o canal mais diretamente ligado à frota em circulação, que ainda sente os efeitos do crédito mais caro, do endividamento das famílias e da ausência de estímulos efetivos à manutenção preventiva dos veículos.
Esse movimento contrasta com o avanço nas entregas de pneus às montadoras, que cresceram 6,6%, atingindo aproximadamente 10,1 milhões de unidades. Ainda assim, esse crescimento não tem sido suficiente para compensar as perdas no varejo e nas oficinas, locais onde o consumo de pneus reflete a economia real e o bolso dos motoristas.
Carros de passeio e veículos de carga também sentem os reflexos
Quando observadas as divisões por categoria, a situação não é muito diferente. O segmento de pneus para carros de passeio teve uma queda de 2,1%, enquanto o de veículos de carga sofreu um tombo ainda maior, com retração de 5,2%. Mesmo com o aquecimento de alguns nichos logísticos e do agronegócio, os números revelam uma pressão constante por preços mais baixos, principalmente diante do avanço das importações.
Importados ganham espaço e pressionam preços nacionais
Um dos principais desafios enfrentados pela indústria de pneus nacional é a concorrência acirrada dos importados, muitos deles oriundos de países com menor custo produtivo e acordos comerciais mais vantajosos. Essa realidade coloca em xeque a capacidade de manutenção de margens por parte das empresas brasileiras, sobretudo diante de uma demanda interna instável.
Além disso, o aumento da presença desses produtos no mercado nacional exige respostas mais sofisticadas em inovação, qualidade e sustentabilidade, já que apenas competir por preço tende a enfraquecer ainda mais a indústria local.
Três caminhos estratégicos para virar o jogo
Diante desse quadro complexo, três vetores principais surgem como pontos de atenção estratégica para o setor automotivo de pneus no país:
- Recuperação do mercado de reposição: o aquecimento da reposição depende diretamente da renovação e ampliação da frota em uso, de melhorias no acesso ao crédito e de campanhas que incentivem a manutenção responsável. Sem isso, o volume tende a continuar abaixo da média histórica.
- Fortalecimento da competitividade nacional: para sobreviver, a indústria precisa acelerar a adoção de tecnologias mais limpas, investir em materiais de alta durabilidade e desenvolver modelos de logística reversa mais eficientes, agregando valor ambiental e funcional aos produtos.
- Políticas industriais e comerciais mais assertivas: é fundamental criar mecanismos de defesa comercial, com controle mais rígido sobre práticas desleais de importação, além de incentivos à exportação e à modernização das fábricas. Só assim será possível manter a relevância da produção local frente ao cenário globalizado.
Pressões crescentes e riscos à participação de mercado
O que está em jogo não é apenas a performance anual, mas a posição de longo prazo da indústria de pneus brasileira dentro da cadeia automotiva. Sem mudanças estruturais — tanto nas práticas comerciais quanto nas políticas públicas —, o setor pode perder protagonismo, com queda de participação no mercado interno e dificuldade de competir internacionalmente.
A estagnação na reposição e o ritmo lento de modernização tecnológica acendem um alerta vermelho. Para virar essa curva descendente, é preciso mais do que esperar pela retomada econômica. A reinvenção do setor exige atitude proativa, inovação e uma visão de futuro clara, onde qualidade, sustentabilidade e eficiência caminhem juntas.



